quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

ANSIEDADE DE MÃE


O filme dirigido por Mel Gibson, “A Paixão de Cristo”, marcou época na historia do cinema por seu realismo e polêmica. Gibson, tido como católico convicto, quis fazer um filme menos para retratar os últimos momentos de Jesus na terra, a partir do sua passagem pelo Jardim do Getsâmani, logo após ter ceado com os apóstolos, e mais para fazer uma espécie de sermão sobre a realidade atual da sociedade capitalista.

Assim, o Jesus de Gibson, interpretado por James Caviezel, nada mais é do que a parcela sofredora da sociedade atual. O martírio que ele sofre no corpo, tido como exagerado por muitos, nada mais é do que a síntese dos sofrimentos dos excluídos.

A ironia dos soldados romanos é a ironia dos poderosos que exploram os pobres até a última gota de seu sangue.

E são muitos os elementos introduzidos por Gibson na sua narrativa. O demônio tentador que não desgruda de Jesus o tempo todo, como um desafio estonteante a ser superado a todo o momento por sua humanidade. Humanidade, aliás levada às últimas consequências, principalmente quando um explorador exaure os explorados numa tortura sem fim.

Cada ,quadro desse filme há uma lição, uma reflexão. A dúvida cruel de Pilatos, o descaso dos sacerdotes, líderes do templo, a mulher que grita “Alguém faça isso parar!” quando Jesus sucumbe ante o peso da cruz que carrega; a postura de João, o Predileto, as atitudes de Maria, a mãe de Jesus; o corvo que vasa olhos de um dos condenados.

Na verdade, Gibson faz um sermão rico e profundo e foi até objeto de um estudo filosófico, transformado em livro.

Por hoje fica a referência a uma cena comovente,como tantas outras, em que Maria, vê seu filho a caminho do suplicio, já todo estropiado e dilapidado na carne... Ela nada fala, em sua mente passa um filme em flash back... Ela se lembra de seu filho menino brincando entre as pedras, caindo, chorando e correndo ao seu encontro em busca de colo e conforto. Ela quer fazer o mesmo... Até ensaia o gesto de ir até ele, mas percebe que Ele, Jesus, tem uma missão a cumprir e que seu sofrimento é o sofrimento de toda a humanidade. E Maria se recolhe e se afasta em direção do anonimato momentâneo.

Recentemente, a TV mostrou uma mãe indignada por ver sua filha presa por fazer, junto com o namorado, um arrastão em ônibus da cidade grande. Ela, inconsolável, batia na filha sob o olhar plácido da polícia. Que dor essa mãe sentia!... Que dor, ao ver sua filha conduzida à privação da liberdade, enterrando sonhos sonhados com carinho desde quando essa moça ainda habitava o seu ventre!

Dores e ansiedade de mães que percebem seus filhos escaparem irreversivelmente por seus dedos e se tornarem criminosos. Mães que choram sós, na solidão, no anonimato, nas orações. Como Maria, acompanhando à distância o martírio de seu filho inocente para depois recolher o seu corpo inerte, tal como retratou  Michelangelo, magistralmente, em “La Pietá”.

Dores e ansiedade de mãe em ver seus filhos se perderem nas penumbras do vício, do descontrole, da morte e da saudade.

... E o sermão de Gibson continua fazendo eco!



Imagem: Google

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